sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Bem que Deus poderia ser um anão de circo

É isso? Tudo se resume, então, a esperar o despertador fritar a cuca para depois irmos ao café com leite? E achar quente? Na janta, mexidão: arroz, feijão. A vidinha é um colar de havaiana que ganhamos lá no centro e você vai ter que rebolar. Entra na lotação, volta para casa. E não tira o colar. Porque ele já não sai. É assim. É fazer papel de bobo. Durante o expediente somos um armário de aço. À noite, um brinde de camelô.

Uma hora o dinheiro dá para mais que um cigarro. E você compra seu sossego. Drogas para aguentar o trabalho, videogame para aguentar a esposa e MBA para a falta do que fazer. Para a tremedeira de cachaça, você bebe mais uma dose, para rebater. Aguente firme, não vai passar. Legal mesmo seria um aparelho de abdominal da Polishop. Serve como espelho. A brincadeira é tentar achar o imbecil do outro lado. Um barato. Quase de graça. Que viagem.

E a alucinação psicodélica causada por calcinha usada de sobrinha adolescente? Você de pau duro vendo Rede TV e de olhos moles no domingo. Eu sei, o preço da picanha anda daquele jeito e o churrasco no domingo já quebrou a laje e as nossas pernas. Diversão mesmo era dedão do pé no asfalto e pipa no vento. Era cabelinho sujo de suor e pezinho na enxurrada. Mas você tinha 12 e isso já era. E você também já era. Porque nunca será. Você vai perder o horário e a carona, corre lá.

Então é assim? Uma vida resumida a lances de gol e tira-teimas? Vascão? Nós na torcida repetindo coros e arrumando brigas? Isso, o máximo do nosso mínimo. E ainda vamos quebrar a cara do outro por um carrinho malvado. Tá bom. Já fizemos pior quando o tema era a cruz e o céu. Porrada neles!

E no paperview, a vidinha alheia, ainda sim, mais vida que a nossa, ou pelo menos mais verdinha, com aqueles gnominhos no jardim. É, rapaz, vida, lembra? Isso aí que você desembrulhou de ontem e vai pôr no micro-ondas. Sai uma quentinha. Olho no lance… Nosso quando muito é a bola na trave ou na placa de patrocínio. E dá-lhe mijo na cabeça.

Eu sei, eu sei. Que papelão o nosso. A gente ainda indo à festa de casamento de terno nesse calor. A gente ainda comprando liquidificador e se divertindo com corte de gravata. Mas a vontade de comer a noiva nunca passa. Daí chegamos em casa, lavamos a mão com sabonete de glicerina e comemos nectarina. Nosso ridículo é um terno preto que nos iguala. Nós todos garçons do próprio desespero. Que grosseiro, trabalhar o dia inteiro e ainda ter que trepar. Não é, querida? A pança dela maior que a sua, mas todas mais ou menos resignadas e cheias de sapos; o pântano inteiro no rumem. Me passa o sal? Obrigado. E um meio sorriso. Amarelo. Segunda tem dentista. CLT tem convênio. CLT é o melhor jeito de pastar e adiar a explosão da bomba no próprio corpo. Diga ahhhhh!

Bem que Deus poderia ser um anão, daqueles palhaços de circo, de circo pobre, que ainda tem caminhão Mercedão azul a carregar as mulas e o hipopótamo. Uma vez por ano a gente se reuniria no picadeiro para rir da cara dele e jogar tomates no seu peito. Bobagem. Mas que ele existe, existe. Ele é o sujeito lá da plateia, o grandão, com bigode, o que ri e se sacode todo com nossas piruetas dentro da cela com os leões. O universo é um episódio dos Trapalhões. E não adianta mudar de canal.

Que grande espera nessa farsa de festa. É na fila e na feira que a gente apodrece de uma vez. Nós somos laranjas, mesmo parecendo com bananas. E o cartão de consumo marcado errado é a prova da nossa estupidez voluntária. É a alquimia moderna. Você não comprou, mas vai ter que pagar. E o cartão de crédito não é a felicidade parcelada, é a tristeza adiada. Ninguém pediu para gente vir. Mas viemos. E o ingresso você compra antes de ver no que vai dar.

E você ainda entrando na piscina pela escadinha. Estoura a bicuda nessa bola, moleque. Pula de cabeça. Vai de voadora para ver o que acontece. Cadê o sangue no nariz? Cadê a veia a quase estourar no pescoço com grito que valha a pena berrar? Porque se não for assim, não me encha o saco, pelo menos fique calado.

É isso, patrão? É com o Power Point que mostramos nossas caras, que na verdade é o nosso rego de fora. Somos todos criaturinhas enganativas, tentando coisar um pouco de alguma coisa que nem sabemos mais que coisa é. E tem a convenção corporativa e palestrante que faz show de mágica. Não faz mal, porque isso não é o pior. Tem ainda os juros, a inflação, o cunhado, o cocô do cão, a promissória, a divisória, os buracos negros, o coração na mão, a Coca Cola, a imaginação que não anda, o tesão que não vem e a Conceição que não menstrua.

E tem esse cubo idiota que nunca consegui montar; e o Justin Bieber que consegue em 2 minutos. É humilhação demais para uma vida só. Vou indo, tropeçando nos bêbados e nos cachorros soltos na calçada. Vou beber com eles. Não são melhores que eu. Eu pelo menos não cheiro tão mal por fora. Mas é só isso. Culpa dos perfumes do DutyFree e dos creminhos da Victória Secret, da nossa épica e mentirosa viagem para o exterior uma vez por ano. Um salve à nossa breve culpa médio burguesa. A vida é uma grande viagem e você é um grande fodão.

Deixa como tá. Vamos indo e virando os lixos. Tem cheiro de costelinha os absorventes velhos e tem restinho de Cheetos. É o que dá para aproveitar. O que sobrar no dedo você chupa. Sorria, você está sendo estuprado. Deixe as epifanias e as galinhas para os poetas e os macumbeiros, que sabem ver (ou inventar) coisas melhores que a gente. Somos o povo bunda, esqueceu? Você e mais eu só fazemos a roda girar para o chafariz alegrar os símios que não estão nem aí para as fontes e os jardins, para os fogos e os jogos. Eles só atravessam a praça em busca do outro lado, de menos um dia. E os canteiros tão verdes com as placas: “proibido pisar na grama”. Acho que era isso. Mas não sei. Aliás, eu não sei nem por que estou falando tudo isso. Imagina você que chegou até aqui.

Via http://www.oruminante.com.br/

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